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Maddalena Morano e o Clima Vocacional das Comunidades

em 15/11/2016 | 00h00min

Maddalena Morano e o Clima Vocacional das Comunidades

Como Madre Morano contribuiu para tornar as comunidades "ambientes vocacionais"?

A pergunta que nos colocamos para este encontro faz ressoar em nós um apelo do CG XXII: promover uma pastoral juvenil vocacional (n. 39, 6) e “Viver com alegria a nossa identidade de FMA, ressignificando as comunidades na fidelidade ao Evangelho e ao carisma […] e colaborando para criar uma cultura vocacional” (n. 40, 1). 

Durante anos o Instituto realizou o aprofundamento desta realidade: o Projeto formativo e as Linhas da missão confirmaram claramente que a animação vocacional encontra na pastoral juvenil o seu espaço vital e a pastoral juvenil torna-se eficaz quando se abre à dimensão vocacional. Mas isso só pode acontecer nas comunidades que são “espaço de crescimento vocacional para cada membro” e “proposta vocacional” para os jovens. 

A animação vocacional, então, não se coloca no final do caminho, mas é uma dimensão, uma prospectiva irrenunciável que qualifica cada projeto educativo, cada comunidade, cada fase do crescimento humano. Não se reduz a alguma estratégia, mas identifica-se com um ambiente. Experimenta-se o ambiente em uma comunidade, oficina vocacional por excelência.

Vejamos então se e como Madre Maddalena, embora com termos diferentes e em um contexto histórico tão distante do nosso, favoreceu nas comunidades uma marca vocacional. Vamos iniciar lembrando os seus pontos de referência que, como rocha sólida, permitiram-lhe consolidar as comunidades como lugares pedagógicos da fé e da experiência vocacional.

Os pontos de referência de Maddalena Morano e das primeiras comunidades:

Ir. Maddalena devia experimentar uma alegria imensa quando dizia: “Eu vi Dom Bosco, falei com ele! Eu estive em Mornese, respirei aquele clima, conheci Madre Mazzarello, eu apertei a sua mão nas suas últimas horas de vida”. 

Sua vida, de fato, foi toda articulada sobre a contínua referência a uma experiência que a marcou em níveis profundos. Ela havia respirado o “espírito de Mornese” e este fato, mais que um privilégio, Maddalena o considerava uma missão. Realmente, havia se proposto a ser santa segundo o estilo de Dom Bosco e de Maria Mazzarello, a qualquer custo, procurando orientar para este objetivo Irmãs  e jovens, leigos, leigas e talvez até mesmo os párocos com os quais colaborava na missão catequética.

Se se analisa, sequência por sequência, o filme da sua vida, descobre-se qual é a sua concepção de santidade salesiana: não se pertencer mais, mas realizar-se no amor, como educadora e  formadora. 

As crianças, os jovens, as jovens haviam realmente povoado a sua vida desde os seus 14 anos de idade. É impossível pensar Maddalena a não ser como guia, como mestra de vida, como companheira sábia, decidida e materna. 

Mostra-nos com os fatos a prática da santidade forjada como guia de outros no caminho da descoberta do projeto de Deus. Sua existência é um sinal transparente do quanto Deus nos ama; por isso a sua vida é apelo para outros, é apelo vocacional.

Ir. Petronila Mazzarello, sua Mestra das Noviças, havia observado longamente e com benevolência aquela noviça que havia entrado no Instituto com 31 anos, durante as aulas ou durante os jogos com suas companheiras, e disse a respeito dela: “Tinha espírito verdadeiramente salesiano”

Os seus pontos de referência de fato permanecem: além do Evangelho, Mornese, Nizza, o ambiente das origens carismáticas, o testemunho de Irmãs nas quais viu encarnar-se a espiritualidade salesiana, as Constituições.

Se estes eram os fortes pontos de referência de Madre Maddalena, vejamos o rosto das comunidades  que ajudou a plasmar e que atraíram as jovens ao Instituto. Destaco alguns traços a partir das fontes:

1.A radicalidade do seguimento de Jesus:

Hoje dizemos que a nossa profecia deriva do nosso ser “memória viva de Jesus”, “epifania do amor de Deus no mundo”, como nos ensina o magistério da Igreja que se encontra em Vida Consagrada e, também, como o CG XXII nos propôs. 

Madre Morano não usa estes termos, mas quando lemos em profundidade a sua experiência de vida e as suas linhas formativas, descobrimos que ela tem a arte de reconduzir ao essencial quase insinuando que basta pouco para se fazer santa e que é fácil tornar-se santa. Existe em sua vida a brilhante arte da síntese, o equilíbrio entre “as muitas coisas a serem feitas” e a prioridade verdadeiramente essencial. A uma Irmã que tinha algumas preocupações, ela escreveu: «Jesus está em casa? Não deixe que ele veja que não lhe basta!».

Põe no coração das suas exortações o mistério do nosso ser chamadas por graça a seguir Jesus e a dedicar-nos totalmente a Ele para a educação da juventude. Não se perde no periférico, mas sempre põe em causa a qualidade de vida, a coerência, o ir mais a fundo, sem meias medidas.

Isso contribuía para criar nas comunidades um ambiente de sério empenho espiritual. É significativa a expressão que as Irmãs lembram ter ouvido em uma de suas conferências: «Oh Irmãs, somos verdadeiramente Irmãs! Não somos noviças, demonstremos então que sabemos ser professas».

Desejava que todas as Irmãs fossem maduras como mulheres, educadoras, catequistas, mestras, mas sobretudo verdadeiras religiosas, pessoas que encontraram o Senhor e que vivem d´Ele. O fazer brota da profundidade do ser. Propunha-se ela mesma um sério caminho espiritual: importa “ser suas realmente”, ser de Jesus, e então era necessário fazer tudo “por Jesus e com Jesus”.  

A uma Irmã que lhe confiava os seus propósitos responde como verdadeira mestra que ajuda a passar do voluntarismo à prospectiva evangélica: «Escute, minha querida filha, deixe estes propósitos e faça este outro que lhe sugiro: “Confronte-se frequentemente com Jesus…”».  Ensinava as noviças a “reviverem Jesus” em todas as ações: “rezando, p. ex. lembrem-se de rezar como rezava Jesus, então sua oração será humilde, fervorosa e atrairá  sobre vocês as mais escolhidas bênçãos”.

Para a novena de Natal assim sugeria a “florzinha”: «Pensar como Jesus pensou – rezar como Jesus rezou – agir como Jesus agiu. Praticá-la não apenas nestes dias, mas por toda a sua vida».  

Era este o ambiente evangélico no qual ela mesma respirava e do qual vivia, como deixou escrito na conclusão do seu último Retiro Espiritual, em 27 de setembro de 1907: «Tratar sempre com Jesus da manhã à noite ».  Habituava as Irmãs a se concentrarem em Deus e a encontrarem tudo e todos n´Ele. A  consciência de sermos  «consagradas para sempre a Jesus deve nos bastar para ficarmos sempre alegres». 

O motivo de nossa alegria é Ele; é d´Ele que os jovens têm fome e sede! O encontro vivificante com Jesus não nos fecha no intimismo, mas nos estimula ao empenho de promover as pessoas dando-lhes o mais precioso dos presentes: anunciar-lhes o Evangelho de Jesus. Por isso para ela a catequese era a sua “paixão dominante”! E as meninas não são somente as destinatárias do Evangelho, mas o lugar de encontro com o Senhor, porque Ele espera ser amado nelas.

Madre Maddalena havia assimilado, no contato com Madre Mazzarello, qual é o verdadeiro sentido da vida e da nossa missão: «O objetivo do cristão é  conhecer e amar a Deus, o das religiosas  é conhecer mais, amar mais a Deus e torná-lo conhecido e amado».  Era precisamente desta plenitude que brotava a alegria do anúncio de Jesus às meninas, o empenho na catequese, a fineza de trato em comunidade ou com as meninas.

É preciso fazer resplandecer a luz, deixar transparecer o amor apaixonado que nos habita.   Isso tornará a nossa existência profética. É a grande entrega do CG XXII. Na conclusão da Assembleia capitular, festa litúrgica de Madre Maddalena Morano, o Reitor-Mor lembrava incisivo: «Caras Irmãs, não há dúvida de que hoje o maior problema da vida cristã, em geral, e da vida religiosa, em particular,  é uma crise de espiritualidade e de sentido: a falta de sabor, de fé existencial, de experiência de Deus vivida, de qualidade evangélica visível, de seguimento radical comprometido. O que se assiste é uma perda de identidade e de sabor daquilo que somos – ou melhor, daquilo que somos chamados a ser – e o Evangelho nos adverte claramente: «se o sal se tornar insípido, com que então se há de salgar?» (Mt 5,13). Uma situação semelhante implica urgência de visibilidade e de legibilidade (testemunho). Isso é possível por meio da radicalidade que é sinônimo de profundidade, coerência, constância, algo não comerciável, não negociável, não efêmero, estável e ao mesmo tempo vital; por meio da experiência do Absoluto, que dá unidade e sentido ao projeto da nossa existência e sem a qual a nossa mesma existência perderia o próprio significado, dissolver-se-ia em uma série de experiências privadas de unidade, e a nossa identidade resultaria triturada».   Temos em nós e nas nossas comunidades, suficiente sabor e força de fermentação para enfrentar a realidade de hoje e para acompanhar os jovens sedentos de Deus?

2.A força contagiante da concórdia em comunidade:

Somos chamadas como comunidade a sermos esta realística constatação: «Nas nossas comunidades não faltam as competências, os meios, as estratégias, mas às vezes é fraco o frescor do amor que dá qualidade à nossa vida» (n. 26). Este frescor de amor exprime-se não apenas individualmente, mas em nível comunitário. dDe fato, ele confere um rosto de alegria ao nosso estar juntas e pode ser um apelo para as novas vocações.

Madre Maddalena está convencida de que a obra educativa é obra comunitária, feita de convergência, de colaboração, de coordenação, de sinergia na intencionalidade e nas participações. Ocorre serem muitos para educar, mas é necessário trabalhar em sinergia para ser eficazes. Ela vê a comunidade como espaço de vida e de relações, penetrada de simplicidade, de alegria, de verdadeira caridade, de total dedicação ao bem das jovens. Este clima ajuda as alunas a se sentirem bem e a desfrutarem o espírito de família. Ao mesmo tempo é força que contagia e convoca. 

Hoje falamos de acompanhamento recíproco, Madre Maddalena fala de “caridade entre Irmãs”,  ajudando-se, apoiando-se e compartilhando a mesma missão educativa. 

Desde a porteira  até a cozinheira, dizia, «todas as que estamos na casa, somos encarregadas das meninas. Cada uma no seu posto, mas todo o trabalho é ordenado ao bem das meninas». 

Com realismo e concretude, recomendava às professoras crescer na estima e na ajuda recíproca, prestar cordialmente apoio mútuo e evitar cada palavra ou gesto de desaprovação do comportamento das colegas. Isso - notava - «exerce uma influência positiva na alma das alunas e lhes permite conceber estima às suas educadoras». A relação cordial entre as professoras não é secundária para o bom êxito da educação. Falar bem umas das outras, sustentar-se mutuamente e valorizar as qualidades de cada uma é oferecer um testemunho de comunhão que “fala” e incide mais do que qualquer outra metodologia. A missão educativa é obra de todas, para além dos papéis e das horas estabelecidas e, portanto, Madre Maddalena adverte a atitude calculista do “toca a mim ou não toca a mim” e educa à ajuda recíproca feita cordialmente, dizendo que é um ato de amor. Este é o Evangelho que todos sabem ler, até mesmo os pagãos. Nos Atos do CG  lê-se: «Demonstrem que vocês gostam de prestar ajuda e de colaborar todas as vezes que são solicitadas».

Hoje as linguagens mudaram: falamos de comunidades interculturais. Naquele tempo não se conhecia esta palavra, mas as fontes nos atestam que em Madre Morano  está presente a educação à acolhida das diferenças: de proveniência geográfica, de idade, de caráter, de formação. Assim escrevia a uma Irmã: «Diz o bom Jesus que devemos levar os pesos uns dos outros, sem distinguir se são Sicilianos ou de outras regiões. A diversidade de caráter produz e  alimenta as ocasiões para o exercício da virtude». 

Não se falava de diálogo intergeracional, mas Madre Morano recomendava com fina sabedoria às Irmãs  idosas a não se admirarem se as professas jovens ainda não tinham o “bom espírito” e lembra com grande sabedoria: «É coisa que se conquista com o tempo, com boa vontade e com o bom exemplo das idosas. Estas sim, procurem ter realmente o bom espírito e ser para as outras espelho fiel da perfeição da Congregação; é este o seu dever! E as jovens serão tais quais são as anciãs!». 

O modo de tratar, a cortesia e a fineza nas relações são a melhor força de convocação que se possa cogitar. Em relação ao internato e à escola,  Madre Morano observava que a condição  para que as nossas casas tenham sempre alunas novas, não está tanto em “fazer propaganda” da escola, mas afirmava sem meios termos: «Se vocês querem atrair mais alunas, devem tratá-las bem; instruí-las bem naquilo que devem saber; vigiá-las bem e dar-lhes exemplo de piedade, de trabalho, de boas maneiras, de modo a não se esquecerem mais».

Colocar a pessoa no centro e cuidar da afabilidade entre as Irmãs são para ela o segredo da eficácia educativa.

A comunidade criada e animada por Madre Morano não é fechada em si mesma, supera a autorreferência para cultivar um pensamento de Igreja e como Igreja, é aberta a horizontes amplos. Na missão educativa estão envolvidas as famílias das alunas e das oratorianas, os párocos, o Bispo, as autoridades civis do território. A educação é obra da Igreja e da sociedade e, portanto, requer um vasto envolvimento de pessoas. Como havia aprendido de Dom Bosco e observado em Mornese e em Nizza, Madre Maddalena convidava, por ex., o Bispo e as autoridades para as solenes premiações escolares e  para presidir os ensaios catequéticos. Ao longo do ano encontrava os modos mais oportunos para possibilitar o encontro das meninas e das educadoras com o Bispo da diocese. É interessante notar que foram conservadas pelo Bispo de Messina, mons. Giuseppe Guarino, várias cartinhas recebidas das aspirantes, noviças e educandas de Alì e de Messina, assim também  conservam-se as cartas recebidas do Bispo. 

Às vezes, o Bispo participava das festas, entretinha-se familiarmente com as educandas e as oratorianas, apreciava seus cantos e seus jogos. No dia 29 de maio de 1892, depois de haver participado da festa de Maria Auxiliadora, na mesma noite escreveu com entusiasmo à Madre Morano: «Fiquei admiradíssimo com o vosso trabalho e com o zelo com que vos dedicais à evangelização das crianças deste bairro, as quais cresciam como os  infiéis. É um bem que fazeis para mim, pois estas pobres crianças são os filhos que a Providência me deu».

Nas comunidades vive-se também o senso de pertença ao Instituto. Quando as Superioras ou os Superiores salesianos estavam de passagem, toda a casa parecia parar para acolher o hóspede. Realizavam-se academias para Madre Caterina Daghero, Madre Emilia Mosca, Ir. Felicina Fauda, Dom Rua, etc.

Em 28 de setembro de 1898, ficou memorável a viagem organizada com as educandas de Alì até Messina e de lá, no dia seguinte, até Reggio Calabria para encontrar Madre Caterina Daghero que vinha de Roma, regressando de sua longa viagem à  America Latina.  Toda ocasião era boa para potencializar o sentido de pertença, não somente à comunidade, mas à grande família do Instituto.

3.A alegria a qualquer custo:

Madre Morano, mulher de temperamento exuberante, alegre, jovial, de extraordinária capacidade comunicativa, é convicta de que sem um clima de alegria é difícil viver o sistema preventivo. «A alegria é o meio indispensável para a formação do caráter das alunas. A verdadeira alegria é a fonte do bem», repetia. Ficava apreensiva quando uma pessoa abria a porta à amargura,  à melancolia e fazia de tudo para ajudá-la a reencontrar serenidade. Recomendava às educadoras  nunca mostrar o rosto demasiado sério e empenhar-se para ficar com os outros sempre alegremente, «porque alegremente deve-se fazer a vontade de Deus». 

Considerava a alegria um meio pedagógico precioso, porquanto abre o coração à confiança e o torna capaz de ser generoso com os demais. A alegria, à qual alude Ir. Maddalena, alimenta-se nas límpidas fontes da amizade com Deus e ao mesmo tempo alcança a sua propulsiva força cotidiana na superação do egoísmo, no dom de si. Transmitindo serenidade aos outros, a serenidade cresce e se consolida. Ela mesma fazia esta experiência quando conseguia superar os inconvenientes dos seus problemas de saúde escondendo-os habilmente por trás do sorriso e do trabalho disponível às Irmãs e às meninas. Os seus olhos “cintilavam de alegria” quando tinha ocasião de “ser útil às almas a preço de qualquer sofrimento”.

Ensinava a percorrer a rota normal da descentralização de si, caminho seguro para a alegria. Assim escreveu a uma Irmã: «Faça você às outras todos os atos de delicadeza (sem ostentá-los) que gostaria de receber: eis o modo de viver em paz, de ser alegre e generosa. Tudo sofrer e nada fazer sofrer!».

Acreditava que a serenidade cultivada e difundida em torno de si produz seguros efeitos terapêuticos e por isso fazia conhecer às Irmãs e às Superioras um método infalível para a cura das doenças. Chamava-o em tom de brincadeira o método “americano”: «Eu acredito que oração, boa alimentação, descanso, ar puro e cuidados prestados com grandeza de coração e alegremente servem para restabelecer muitas das nossas pobres e queridas enfermas (sim senhora! As enfermas precisam sentir isso em quem cuida delas, as serve, as assiste)».

Ela mesma praticava este método. Conta-se que na casa de Messina já fazia algum tempo que lá estava uma Irmã enferma. Um dia, no recreio, a fim de proporcionar bom humor àquela que vivia  na solidão de uma enfermaria, organizou uma simpática surpresa. Convidou todas as Irmãs a se exibirem com um alegre concerto de tampas, latas, tamborins e bandolins improvisados.

Ela tinha o "carisma da alegria", foi dito a seu respeito. O seu primeiro biógrafo, Garnieri, escreve: «Sentia pena ao ver as Irmãs tristes ou amuadas e dizia que as únicas pessoas que não sabia tolerar eram as Irmãs sempre prontas a ficarem amuadas com cada aviso; rezava ao Senhor para não lhe dar este presente ou pelo menos que lhe desse a força para suportar».  A sua pedagogia era a da alegria que criava na comunidade um clima sereno, onde Irmãs  e meninas viviam felizes e concordes, tendendo juntas à santidade. É nesta ótica que aprofundamos o valor formativo das festas. 

Para nós, FMA, a alegria é uma missão, é um caminho privilegiado para difundir esperança e confiança na vida dos jovens e de quem vem ao nosso encontro. A alegria não é apenas cultivada no coração, mas transmitida em múltiplas experiências envolventes. Segundo a tradição salesiana, a vida das comunidades educativas, dos oratórios, dos internatos,  é marcada por festas, jogos, passeios, representações teatrais. Estas experiências são consideradas verdadeiros momentos de síntese formativa porque favorecem a interiorização dos valores e o protagonismo, pois todos ficam ativamente empenhados na preparação e na execução.

Para nós, educadoras, as festas têm  um forte valor convocatório: oferecem-nos a oportunidade de encontros, de partilha e de intercâmbios mútuos, com o sabor da família. Por que não valorizá-las como caminho de evangelização?

4.A formação religiosa e o cuidado com a catequese:

Em um tempo marcado por um difundido analfabetismo cultural e, portanto, pela urgência da evangelização, a experiência de Madre Morano é para nós de grande atualidade. Ela era convicta de que está no nosso DNA a missão de dedicar-nos à educação dos jovens à fé e à criação de ambientes que favoreçam o seu gradual amadurecimento na mentalidade evangélica e na vida eclesial. O seu doar-se é marcado por uma originalidade e por uma capacidade de envolvimento que são dignos de admiração. 

Nós, religiosas educadoras, colocamo-nos, por vocação,  no dinamismo da Igreja sequiosa do Absoluto e testemunha do Absoluto, cuja missão peculiar é o anúncio de Jesus. Portanto, ai de nós se não o anunciarmos!

No Instrumento de trabalho em preparação ao CG XXII, que considero uma clara radiografia do Instituto, lê-se que hoje, em todas as Inspetorias, toma-se mais consciência de que a catequese «deveria ser mais valorizada em nossos ambientes»  e no CG foi reiterada a urgência de requalificar a catequese e de preparar pessoas competentes em âmbito catequético. 

A formação catequética era para Madre Morano uma prioridade: o fundamento de todo empenho moral e da regeneração do tecido social. A obra da catequese, para além do âmbito das escolas e dos oratórios, estendia-se às paróquias, às igrejas da periferia, envolvendo nesta missão eclesial as jovens mais empenhadas e as próprias FMA.  As Escolas femininas de catecismo foram a resposta pronta e clarividente à necessidade de evangelização e, por isso, uma contribuição decisiva ao despertar catequético da diocese de Catania.

Madre Maddalena organizava verdadeiras escolas de religião de nível superior para as estudantes, com a finalidade de formá-las cristãs convictas e apóstolas corajosas no ambiente escolar, no mundo do trabalho e nas suas comunidades paroquiais. «Não deixar que Jesus definhe nas almas» era a grande finalidade missionária que a impelia na sua obra de coordenação catequética, em 18 paróquias da diocese de Catania. 

Sua aguda capacidade de conhecer as situações e as pessoas levaram-na a perceber a verdadeira necessidade de formação religiosa que as pessoas tinham,  sobretudo as crianças e as jovens. Em 1899 escreveu à Ir. Luigina Cucchietti dizendo que não podia mais invejar as missionárias que partiam para a América: «com viagem menor aqui encontramos o mesmo tipo de campo a ser cultivado». 

Podemos dizer que soube acompanhar também os párocos na sua missão. Sempre em profunda sinergia com o Bispo, sabia chamar a atenção dos padres para o valor da catequese às crianças e os guiava para que colocassem a catequese no mais vasto quadro da educação. Quanto sofria ao encontrar sacerdotes relutantes para evangelizar!

Para Madre Morano, criar um ambiente formativo queria também dizer empenhar-se para reavivar as famílias na vida cristã. Valha para todas o testemunho do cônego Salvatore Puglisi Grassi: «Por meio das crianças penetrava nas famílias para curar as chagas morais que lá havia. Lembro, a tal propósito, ter ouvido o arcebispo Dusmet dizer que, durante a sua permanência em Trecastagni, conseguira transformar moralmente aquela região que estava afastada da frequência aos sacramentos e vivendo  uma fé muito lânguida; o mesmo fez em Alì e em outras regiões, onde fundou suas obras». 

Em profunda sintonia com o Bispo Francica Nava, Madre Morano estava persuadida de que a raiz do processo de descristianização da sociedade era devida à atitude de passividade e de resignação dos próprios católicos. 

Onde quer que vamos, somos chamadas a proclamar o amor infinito de Deus e a visão da pessoa humana no plano de Deus. Evangelizar é a vocação da Igreja e é a nossa vocação de FMA. Nunca como hoje os jovens tiveram tanta sede de certezas e de valores.

Mas é preciso que as nossas comunidades sejam evangelizadas para que sejam evangelizadoras. De um coração evangelizado fluirão palavras novas sobre os lábios, palavras de luz e de esperança.

5. A arte do acompanhamento:

A partir das fontes descobrimos que poderíamos descrever Madre Morano como “aquela que tem tempo para os outros”. Sabe realmente dar aos outros o grande presente da “presença”, condição indispensável para quem quer guiar e acompanhar.

O acompanhamento, do qual hoje tanto falamos, só é possível a quem está atento à pessoa e às potencialidades que nela podem ser desenvolvidas. Assim saberá colocar-se ao lado, escutar, compreender as exigências e suscitar as perguntas que fazem crescer. 

Para Madre Morano acompanhar as pessoas é expressão do Sistema preventivo com a finalidade de ajudá-las a realizar-se de acordo com o projeto de Deus. Por isso, é necessário criar um ambiente rico de valores que facilite o amadurecimento. Falando a respeito das Irmãs jovens a serem acompanhadas sobretudo nos primeiros tempos depois da profissão, fazia notar às diretoras: “elas têm fome das coisas espirituais”.  Portanto,  não podemos frustrar esta profunda sede do coração humano. É expressão de amor, “um amor com vistas largas”, praticado com inteligência e sabedoria, caso contrário pode não ser verdadeiro.

O estilo mais eficaz para se alcançar este objetivo é aquele marcado pela doçura, pelo otimismo, pela confiança, e – ao mesmo tempo – pela exigência, firmeza e docilidade aos caminhos do Espírito. 

Realmente, qualquer pessoa que estivesse precisando de sua ajuda era cercada por ela de delicadas e diligentes atenções: a educanda gravemente enferma, a pessoa depressiva ou desanimada, a jovem preocupada com uma situação familiar crítica, a marquesa Caterina Scoppa Loffredo di Cassibile envolvida em um processo, ou a Irmã que há pouco tempo trocou de comunidade e se sente perdida, a diretora que encontra ao seu redor um clima de desconfiança, o marionetista que gostaria de continuar suas exibições durante o Congresso eucarístico de Catania. Madre Maddalena está ao lado de cada pessoa com sabedoria e prudência, sempre com sincera caridade e compreensão.

Era possuidora de um “vasto potencial de afeto” que se exprimia com ternura materna a todos.  Era uma caridade atenta, concreta, preocupada com o bem espiritual da pessoa e também material, quando era o caso. Com tato pedagógico sabia ajudar a tender decididamente à meta, sem exasperar, mas persuadindo com a razão e a amorevolezza. Com muita franqueza, escreveu a uma Irmã: «Que pena me causa  saber-te ainda não estável em fazer as coisas visando a Deus somente e olhando as criaturas por Ele somente». 

Consciente de que cada pessoa tem um valor inestimável, recomendava «multiplicar as ocasiões» para demonstrar a cada uma confiança, estima, caridade.  Também ela propunha-se  a viver esta atitude e anotou em seu caderno: «Não poupar-se de fazer o bem  às almas de todas as formas possíveis».  

O escopo do acompanhamento é ajudar as pessoas a encontrar Deus e a verdadeira felicidade. Os Atos do CG XXII apontam para este escopo claramente ao lembrar-nos que cada relação de acompanhamento tende a «realizar o desígnio de Deus sobre cada pessoa». 

Por isso, Madre Morano não tolerava abusos, negligências, mediocridades. Intencionava orientar as pessoas a se libertarem daquilo que impede a verdadeira maturidade no amor. Era muito compreensiva e benévola com as necessidades de cada Irmã e de cada menina, era muito forte e determinada ao ajudá-las  a melhorar-se a si mesmas, mesmo à custa de sacrifícios e de renúncias. Dizia que as amêndoas amargas fortalecem o espírito.  A atenção de Madre Morano ao crescimento integral das pessoas transparece desta sua convicção: «Não basta instruir, é preciso formar o coração». É necessária a formação de uma consciência reta, capaz de escolhas e decisões inspiradas no bem, na verdade, no amor.

No relacionamento com as meninas ensinava – hoje dizemos – “a chamar pelo nome os próprios sentimentos”,  a superar toda forma de vaidade, as buscas egoístas,  o dobrar-se sobre si, os servilismos. Corrigia com enérgica firmeza e ao mesmo tempo com bondade, deixando a alma serena. Procurava sobretudo formá-las para uma vida adulta, responsável e socialmente útil.

Como escreve a nossa Madre em suas circulares (n. 904 e 905), o acompanhamento começa com o empenho de deixar-se acompanhar: pelo Espírito Santo que trabalha em nós por meio da escuta da Palavra, da Eucaristia, da fidelidade às Constituições e ao colóquio. É uma realidade não só dialógica entre duas pessoas, mas é um clima que se cria e se reforça no ambiente. De acordo com o modelo salesiano, a realização do acompanhamento não pode ficar fora de uma comunidade cristã onde se caminha com os jovens e as jovens rumo à santidade. 

Conclusão:

No final do discurso não sei se respondi à pergunta inicial, talvez tenhamos coletado algumas ideias… Uma coisa é certa: há um liame indissolúvel entre o empenho da formação permanente e a eficácia da missão educativa vocacional. Quanto mais o carisma for vivo nas comunidades, mais elas terão força de convocação.

O carisma não é uma realidade estática que basta conhecer, estudar e conservar, é uma realidade dinâmica que se transmite com a vida de pessoa a pessoa, de geração em geração. Cabe a todas nós e a cada uma de nós a responsabilidade de garantir o futuro do carisma, portanto cada comunidade deve encarregar-se da vitalidade do carisma e de sua irradiação.

Jesus nos diz: “Buscai em primeiro lugar o Reino de Deus e a sua justiça e todas as coisas vos serão dadas por acréscimo” (Mt 6,33). Perguntemo-nos com toda sinceridade: O que mais nos preocupa? O reino de Deus ou garantir a nossa segurança diante de um futuro incerto? Nesta hora da história, as razões para preocupar-nos são tantas, mas também nisso existem prioridades. As verdadeiras preocupações, que ativam o nosso empenho de responsabilidade, não deveriam ser o fechamento das obras ou a diminuição das Irmãs, o envelhecimento ou o avanço de uma certa insegurança também econômica, no nosso Instituto. Deve preocupar-nos, sobretudo, a radicalidade do seguimento de Jesus, a imagem da vida religiosa-salesiana que transmitimos a quem vive ao nosso lado, a genuinidade do amor que anima as nossas comunidades, o clima espiritual que se respira, a alegria dos nossos rostos como expressão da profunda paz que nos habita, o anúncio do Evangelho de Jesus às pessoas que têm sede e fome da sua Palavra, a nossa capacidade de “estar” com os jovens como nos ensinaram os nossos Santos. 

Se, na verdade, estamos  preocupadas com isso – como prioridade – então as nossas comunidades terão força convocatória, serão proféticas, tornar-se-ão laboratórios de fé, de Evangelho vivo, onde as vocações amadurecem e onde, também, a resposta à nossa vocação se torna sempre mais forte e contagiosa.

Madre Morano acreditou e mostrou-nos um caminho não fácil, mas cheio de luz. Percorramos juntas este caminho como comunidades educativas, com coração completamente aberto à esperança!

Suor Piera Cavaglià, 2009

Fonte: Redação