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Carta de Dom Orani para o Ano da Vida Consagrada

em 02/02/2015 | 00h00min

Carta de Dom Orani para o Ano da Vida Consagrada

GRATIDÃO, PAIXÃO, ALEGRIA E ESPERANÇA

Carta Pastoral do Cardeal Orani João Tempesta para o Ano da Vida Consagrada

Aos irmãos e irmãs no Deus que a todos ama,

Aos sacerdotes, diáconos e consagrados,

Aos irmãos bispos auxiliares, que tanto me auxiliam na minha missão na Arquidiocese de São Sebastião do Rio de Janeiro

Queridos Consagrados e Consagradas


1.            A Alegria do Evangelho enche o meu coração de pastor neste ano tão especial para nós, religiosos, que encontramos o Cristo pobre, casto e obediente e que, de acordo com nossas regras e constituições, nos impulsiona para viver com generosidade cada instante de nossas vidas. Que neste tempo de graça e salvação, no encontro diário com nosso Mestre e Senhor, renasça sem cessar, em cada um de nós, a paixão, a alegria e a esperança[1].

 2.            Queremos, com o Papa Francisco, dar graças ao Pai, ao Filho, através de nossa plena adesão ao seu Evangelho e do serviço à sua Igreja e, de igual modo, bendizemos o Espírito Santo que nos plenifica de alegria e nos torna testemunhas do seu amor e da sua misericórdia neste belo Ano da Vida Consagrada, que teve início no último dia 30 de novembro de 2014, I Domingo do Advento, e terminará com a Festa da Apresentação de Jesus no Templo, em 02 de fevereiro de 2016. Sabemos que esta celebração, traduzida pelo povo como de Nossa Senhora das Candeias, sempre foi uma data em que grande parte dos religiosos e religiosas emitia seus votos de consagração. Eu mesmo me recordo dessa data com muito carinho, que marcou os meus primeiros e, mais tarde, definitivos votos.

3.            Unimo-nos ao Papa Francisco, aos consagrados e consagradas, assim como à Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e às Sociedades de Vida Apostólica, e juntos, louvamos a Deus pela proclamação de um Ano para a Vida Consagrada [2], por ocasião do quinquagésimo aniversário da Constituição Dogmática Lumen Gentium sobre a Igreja que, no capítulo VI, trata dos religiosos, bem como do Decreto Conciliar Perfectae Caritatis, sobre a renovação da vida religiosa.

4.            Este ano proclamado pelo Papa Francisco em sua Carta Apostólica “Às pessoas Consagradas” deverá ser uma ocasião para um aprofundamento da Vida Consagrada na Igreja. É importante refletir sobre alguns temas do Evangelho, Profecia e Esperança! Isso tudo nos convida a um tempo de meditação e atitudes concretas, agradecendo pelo dom da vida religiosa e outras formas de vida consagrada em nossa Arquidiocese, em sua história marcada por esta presença desde os inícios e ainda hoje, nos atuais desafios da “mudança de época” cultural.

5.            Este tempo é uma oportunidade de testemunharmos a possibilidade da construção da paz em nosso país (Ano da Paz proclamado pela CNBB), e de alimentar a esperança em tempos novos (Ano da Esperança na Arquidiocese de São Sebastião do Rio de Janeiro) sempre tendo Cristo, nossa paz, como razão e fundamento de nossa esperança. Ao fazer memória da história dessa “Cidade Maravilhosa” em seus 450 anos atualmente celebrados, vemos com muita alegria a presença da vida consagrada desde o início no anúncio de Cristo, levando as pessoas à fé e contribuindo na construção de uma cultura de paz, educando gerações de cristãos nos valores da vida humana.

6.            A vivência do Cristo pobre, casto e obediente deve ser sempre possibilitadora de liberdade interior e exterior para atitudes de evangélica radicalidade na direção da paz e, com isso, suscitar esperança nos corações de quem sofre. A consagração manifesta-se no testemunho pessoal e comunitário. Tal realidade em nossos dias, tão marcados por perplexidades, é um sinal fecundo de paz e de esperança. Que cada consagrado faça de sua vida um exemplo forte de sonho e ação pela paz, num caminhar sempre pautado na esperança.

7.            Seguindo fielmente o ensinamento do Papa Francisco, e em plena comunhão com o Magistério de São João Paulo II, repetimos a orientação da Exortação Apostólica pós-sinodal Vita Consecrata: “Vós não tendes apenas uma história gloriosa para recordar e narrar, mas uma grande história a construir! Olhai para o futuro, para o qual vos projeta o Espírito a fim de realizar convosco ainda coisas maiores”. [3] E é com perspectiva de futuro que olho esta oportunidade que se delineia a nossa frente nesta região metropolitana, que é uma verdadeira vitrine para o mundo.


Objetivos do Ano da Vida Consagrada em nossa Arquidiocese:


8.            Um importante objetivo do Ano da Vida Consagrada em nossa Arquidiocese de São Sebastião do Rio de Janeiro é, também, um convite a contemplar com gratidão o passado, isto é, um olhar atento e profundo, cheio de ação de graças e alegria para cada um dos nossos Institutos, de onde provém toda aquela rica história carismática. Neste ano, somos convidados a retornar para as nossas origens, o carisma fundacional, onde está presente a ação de Deus que, no seu Espírito, chama, na perspectiva de um carisma específico, algumas pessoas a encontrarem e seguirem de perto a Jesus Cristo, traduzindo o Evangelho numa forma particular de vida, lendo, assim, com os olhos da fé, os sinais dos tempos e dando de forma criativa uma resposta às necessidades da Igreja.

 9.           Neste ano, é fundamental que cada família religiosa recorde o seu carisma, os seus inícios e o seu desenvolvimento histórico, isto é, usando a imagem do Papa Francisco, olhar como a semente se tornou uma árvore, alargando seus ramos. Este ano tem por primeiro objetivo, portanto, um gesto de gratidão a Deus que, deste modo, ofereceu à Igreja tantos dons que a torna bela, fecunda e habilitada para toda boa obra.[4]


 10.         Rever a própria história é indispensável para manter viva a identidade e também fomentar a unidade da família religiosa e o sentido de pertença dos seus membros. Isto não é o cultivo de inúteis nostalgias, mas da retomada do caminho das gerações passadas para nele buscar a fonte inspiradora, os ideais, os projetos, os valores que moveram todo o caminho percorrido, desde os fundadores, as fundadoras e as primeiras comunidades, unindo aos passos dados até os dias de hoje.

11.          Essa gratidão é uma tomada de consciência de como foi vivido o carisma ao longo do tempo e da história, que criatividade foi inspiradora para que dificuldades e desafios fossem enfrentados e como foram superados. Essa consciência poderá apontar as incoerências, fruto das fraquezas humanas, e até mesmo do esquecimento de alguns aspectos essenciais do carisma.

12.          Fazer memória, além de nos ajudar a buscar as raízes de nossas vocações, é também um grande impulso para viver o carisma fundacional nos desafios próprios de nossos tempos. Diante de uma sociedade que se esfacela e é inundada de injustiças, violências e desigualdades, a vida consagrada é desafiada a encontrar seu espaço e lugar para poder servir ao povo de Deus, levando-o ao encontro com o Cristo Senhor Ressuscitado.


13.          Que este Ano da Vida Consagrada seja ocasião para confessar, com gratidão, humildade e confiança em Deus, que é amor[5], a própria fragilidade e como ela é ocasião para viver a experiência da reconciliação e do amor misericordioso do Senhor. Sempre é tempo de recomeçar ou de incrementar ainda mais a nossa missão que se inicia, acima de tudo, pelo “ser”, antes do que pelo “fazer”. Somos chamados a ser testemunhas de unidade, comunhão, vida fraterna e, principalmente, de entrega ao Senhor no carisma específico, em comunhão com a Igreja particular onde estamos inseridos.

14.          Outro objetivo deste Ano da Vida Consagrada é o convite feito pelo Papa a viver com paixão o presente. Isso mesmo! Paixão é a palavra que somos impelidos a viver. A lembrança cheia de gratidão do passado nos impele a uma escuta orante, atenta àquilo que o Espírito diz hoje à Igreja, para que possamos implementar, de maneira ainda mais profunda, aspectos fundamentais da nossa vida consagrada. Saber ver os sinais dos tempos e viver com alegria o carisma a que fomos chamados nos faz perceber que, diante da crise do mundo hodierno, esta é a oportunidade de anunciarmos ainda mais o caminho da vida e salvação em Jesus Cristo Nosso Senhor, e isso com atitudes concretas.

 15.         Desde os inícios do monaquismo, tanto no Oriente quanto no Ocidente, até hoje nas “Novas Comunidades” também presentes em nossa Igreja Particular, cada forma de vida consagrada nasce do apelo do Espírito Santo que move e suscita o seguimento a Jesus Cristo, segundo o ensinamento de sua Palavra.[6] Para os fundadores e fundadoras, a regra em absoluto é o Evangelho; qualquer outra regra de vida é o reflexo, a expressão do Evangelho e instrumento para vivê-lo em plenitude. O nosso ideal é Cristo, assim, devemos aderir inteiramente a Ele, dizendo como São Paulo: “Para mim, de fato, o viver é Cristo”[7]. Os votos só têm sentido se contribuem para implementar este amor apaixonado. É justamente nesta paixão pela Boa Nova da Salvação, isto é, no seguimento radical de Cristo pobre, obediente e casto que a nossa consagração recebe o seu incremento e entusiasmo.

16.          Lembremo-nos de quantos irmãos e irmãs nossos deram com alegria suas vidas para a causa do Reino de Deus! Quantos mártires em nossos institutos! Quanta disponibilidade que testemunhamos! Seria muito interessante neste ano fazer vir à tona estes sinais em nossas comunidades para que, tanto os jovens quanto os mais antigos possamos ver e atualizar o entusiasmo pelo dom que recebemos e pela vida que somos chamados a entregar em cada momento.

17.          Por isso, algumas perguntas devem nos inquietar nesta Ano da Vida Consagrada: “Deixamo-nos ser interpelados pelo Evangelho? Como? A Palavra de Cristo é verdadeiramente uma referência para a vida diária e para as ações e opções que somos chamados a fazer?” Isso é realmente exigente e deve ser vivido com radical sinceridade. Jesus pede para pôr sua Palavra em prática e não somente lê-la ou apenas meditá-la, mas sim vivê-la com alegria.

18.          Portanto, segundo o Papa Francisco, viver com paixão o presente significa tornar-se “peritos em comunhão”, tema este muito citado em diversos documentos do Magistério. Isso significa que, numa sociedade marcada pelo conflito, a convivência difícil entre culturas diversas, a prepotência em relação aos mais fracos e as desigualdades, somos chamados a oferecer um modelo concreto, visível, palpável de comunidade/comunhão de vida, mediante o reconhecimento da dignidade de cada pessoa e a partilha do dom que cada um possui. Isso nos permite viver relações fraternas, isto é, somos chamados a experimentar o milagre da unidade na pluralidade. Viver alegremente a vida de comunidade pode ser motivo de testemunho para as novas gerações que desejam assumir um modo radical de vida evangélica.

19.          O grande serviço que a vida consagrada presta à Igreja é a própria vida em comunidade, ou seja, em nossas casas, missões e trabalhos poderíamos colocar um objetivo especial neste ano: a vida em fraternidade vivida com carinho, sem isolamentos, cheia de atitudes de atenção e delicadeza, sobretudo com os doentes e idosos; uma fraternidade amorosa e efetiva capaz de unir sempre mais a comunidade para viver seus grandes ideais com generosidade e alegria. Seria muito importante que o mundo de hoje pudesse reconhecer no cotidiano de nossas comunidades o “vede como se amam”! Esse testemunho também animará muitos jovens a seguirem esse carisma com o coração aquecido pelos ideais da radicalidade da consagração.

 20.         Como cariocas, (os aqui nascidos ou os que para cá viemos) assumimos a vida e cultura dessa grande metrópole e não podemos deixar de mencionar um carisma natural que perpassa o nosso povo brasileiro e que encontra nessas terras fluminenses grande eco: a alegria.  Não foi coincidência o Documento de Aparecida usar a expressão “Alegres discípulos-missionários”[8]. O núcleo da Exortação Apostólica Evanglii Gaudium do Papa Francisco, que participou da elaboração do Documento de Aparecida quando ainda Cardeal, fala-nos com vitalidade surpreendente da alegria. Ele narra, em sua Exortação, a parábola da alegria, dizendo-nos do encontro com Jesus, que acende em nós a beleza original, aquela do rosto sobre o qual resplandece a glória do Pai[9], no fruto da alegria. Como não esquecemos também as palavras de nosso saudoso Papa São João Paulo II, que nos alertou através da Exortação Apostólica Pós-Sinodal Vita Consecrata: “O primado de Deus é plenitude de sentido e de alegria para a vida humana, pois o homem está feito para Deus e inquieto até encontrar n’Ele a paz”. [10] A alegria supõe a gratidão e a paixão, bem como a esperança. A carta circular da Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica, que abriu o Ano da Vida Consagrada, foi justamente sobre esse tema: “Alegrai-vos”!

21.          Outro objetivo que se pretende neste Ano da Vida Consagrada é abraçar com esperança o futuro, diante dos desafios e das dificuldades que enfrenta a vida consagrada: em alguns casos a diminuição das vocações, em outros o envelhecimento dos(as) consagrados(as), às vezes o desânimo devido a divisões internas, dificuldades em perdoar e conviver uns com os outros, levando tantos irmãos e irmãs a procurarem outros caminhos. Além disso, em face dos atuais problemas econômicos na sequência da grave crise financeira mundial, na globalização, além das insídias do relativismo, a marginalização e a irrelevância social (...), é que se atualiza a potência de nossa esperança, que continua a nos fazer repetir as Palavras do Senhor: “Não tenhas medo (...), pois estou contigo”. [11]

22.          O Papa Francisco é muito claro para todos nós e nos exorta que a esperança de que falamos não se funda sobre números ou sobre obras, mas sobre Aquele em quem pusemos a nossa confiança[12] e para quem “nada é impossível”. [13] Esta é a esperança que não decepciona[14] e que permitirá à vida consagrada continuar a escrever uma grande história no futuro, para o qual se deve voltar o nosso olhar, cientes de que é para Ele que nos impele o Espírito Santo, a fim de continuar a fazer conosco grandes coisas.


Novos Horizontes:

23.          Como pastor, espero, particularmente neste Ano da Vida Consagrada, contemplar novos horizontes: crescimento espiritual, disponibilidade para servir e cooperar com a Igreja local onde estão inseridos, bem como a alegria no viver, pois desejo que entre nós não se vejam rostos tristes, pessoas desgostosas e insatisfeitas. Numa sociedade que ostenta o culto da eficiência, da saúde, do sucesso e que marginaliza os pobres e excluídos, os “perdedores”, podemos testemunhar, através da nossa vida, a verdade destas palavras da Escritura: “Quando sou fraco, então é que sou forte. ”[15] Sem dúvida que será o grande desafio de construir uma sociedade de paz, caminhando na esperança nesta cidade bela, porém cheia de divisões e injustiças.

24.          Aplicamos à Vida Consagrada, portanto, o que o Papa Francisco escreveu na Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, citando uma homilia do Papa Bento XVI: “A Igreja não cresce por proselitismo, mas por atração”. [16] A Vida Consagrada não cresce, não alarga seus horizontes se apenas organizarmos belas campanhas vocacionais, mas se as jovens e os jovens que nos encontram sentirem-se atraídos por nosso entusiasmo, se nos virem como homens e mulheres felizes! Deste modo, é o nosso testemunho que deve falar, uma vida na qual transparecem a alegria e a beleza de viver o Evangelho e seguir a Cristo. Lembremo-nos de Paulo VI na Evangelii Nuntiandi: “Os homens de hoje escutam mais as testemunhas que os mestres; e se escutam os mestres é porque são testemunhas”.

25.          Vivemos em uma bela e importante cidade, porém cheia de injustiças, violências e muitos problemas culturais e sociais. A Igreja que está no Rio de Janeiro quer contar ainda mais com os carismas da vida consagrada para ser uma presença “próxima” de tantos irmãos e irmãs que sofrem com a marginalização e o empobrecimento. São inumeráveis necessidades que existem e às quais temos dado algumas respostas que nos animam e encorajam. Mas a “messe é grande”! Há muitas pessoas, mulheres e homens, jovens e crianças, idosos e solitários, que aguardam nossa fidelidade ao mandato de Cristo e sofrem por causa da desnutrição, do desemprego, pela exclusão social e, além disso, inseridos em realidades em que a atividade criminosa violenta e armada ceifa vidas aos seus entes queridos. É imensa a missão na grande cidade! Vivendo o carisma e abrindo os corações para os necessitados de carinho e atenção, nós mesmos cresceremos em nossa vida consagrada e em nossa alegria ao encontrar Cristo na “carne do pobre”, como bem nos recorda o Papa Francisco. A presença de tantos irmãos e irmãs que fazem a Igreja presente em situações difíceis é uma realidade que agradecemos e incentivamos. No meio deste mundo dividido e em ruptura somos chamados a ser testemunhas do Amor e da Reconciliação, fazendo a partir desse Amor, uma opção concreta por Cristo presente nesses irmãos e irmãs. Assim responderemos, a partir de Cristo, a um sistema econômico que coloca os benefícios antes do homem, de uma cultura que descarta o ser humano como “um bem de consumo”, antes do que promover a sua dignidade de pessoa.

26.          Outro ponto importante a ser contemplado, que é fundamental em nosso contexto eclesial, e que alargará os nossos horizontes neste Ano da Vida Consagrada, é que espero ver crescer a comunhão entre os membros dos diferentes Institutos de Vida Consagrada, bem como das “Novas Comunidades”. Não poderia ser este ano melhor ocasião de sair, com maior coragem, das fronteiras do próprio Instituto ou “Nova Comunidade”, para se elaborar em conjunto, a nível Arquidiocesano, projetos comuns de formação, de evangelização, de intervenções sociais, podendo, assim, oferecer a toda a nossa Igreja Particular, de forma mais eficaz, um real testemunho profético.  A comunhão e o encontro entre os diferentes carismas e vocações é um caminho de esperança. A unidade é uma característica imprescindível para podermos evangelizar. E cada Instituto ou Comunidade tem muito a partilhar e a receber um do outro. A unidade na diversidade para que o “mundo creia” e, assim, possamos desvelar ao nosso povo que “Deus habita nesta cidade”. A cultura do diálogo que desejamos para todos os atores desta metrópole deve começar conosco, em nossas vidas e missões.

27.          Um tema muito caro em minha formação religiosa e que procurei colocar em prática em minha vida é o “sentir com a Igreja”. Quem tem São Bernardo como um grande monge e, ao mesmo tempo, um homem do seu tempo e preocupado com todas as situações de sua época, sabe a importância de vivermos o carisma e, ao mesmo tempo, com os pés na realidade, permanecermos unidos e “sentindo” com a Igreja local, seus sonhos, suas dificuldades e suas soluções. São muitas comunidades que assim vivem, mas temos necessidade de incrementar ainda mais tal realidade. Os tempos são difíceis para todos e a unidade entre nós é um dos sinais da presença da Igreja aqui nestas terras. Convido a todos para trazerem seus carismas para a missão em terras cariocas e compartilhar de nossos anseios e buscas, unidos dentro de uma caminhada Arquidiocesana. Juntos, sob a ação do Espírito Santo, chegaremos mais longe em nossa missão!

 28.         O Papa Francisco aqui no Rio de Janeiro, durante a Jornada Mundial da Juventude, desafiou-nos a uma missionariedade que aplico no contexto atual do Ano da Vida Consagrada e, por isso, exorto também a todos a sair de si mesmos para ir às periferias existenciais: “Ide por todo mundo”.[17] Não nos fechemos em nós mesmos, não vos deixeis asfixiar por pequenas brigas de casa, não fiquemos prisioneiros de nossos problemas. Estes serão resolvidos se sairmos para ajudar os outros a resolverem os seus problemas, anunciando-lhes a Boa Nova. Encontraremos a vida ofertando nossa própria, a esperança dando a esperança, o amor amando. Ao olhar o vasto horizonte e a grande missão que nos espera, com Cristo, abertos ao Espírito Santo, saberemos superar nossas dificuldades e os conflitos diários.

29.          Deste modo, caros consagrados e consagradas, sempre com ardor renovado, somos impelidos através de nosso chamado a Evangelizar, tornando-nos arautos da Palavra de Deus, onde quer que exerçamos nossa missão. Começando com o testemunho e vivendo o carisma, somos chamados a dar as razões de nossa fé. Este ímpeto evangelizador deve ser forte em nossos corações! Contudo, devemos cuidar, como alertou o Papa Francisco, para não cairmos no “martalismo” (que vem de Marta), ou seja, aqueles que mergulham no trabalho descuidando da melhor parte, que é sentar-se aos pés de Jesus [18]. Portanto, a máxima beneditina se faz necessária, em nossa vida, “Reza e trabalha”[19]; evangeliza, anuncia com a Palavra por meio de uma catequese eficiente e adaptada às exigências de hoje, entretanto, sem descuidar do dever da oração, que sustenta e dá pleno sentido a toda e qualquer ação evangelizadora.


11º. Plano de Pastoral de Conjunto


 30.         O Ano da Vida Consagrada em nossa Arquidiocese de São Sebastião do Rio de Janeiro está em conformidade com o que nos indicou o Objetivo Geral de nosso 11º. Plano de Pastoral de Conjunto, isto é, sermos uma Igreja que anuncia e reanuncia Jesus Cristo, que não se cansa de anunciá-Lo, sendo uma rede de Institutos e Comunidades, procurando uma sinergia sincera e viver a comunhão entre todas as vocações na Igreja, a começar pelos presbíteros e os leigos, a fim de fazer crescer a espiritualidade de comunhão nos diversos serviços e ministérios, em permanente estado de missão, a serviço da vida em todas a suas instâncias.[20] Este ano, dentro de nosso planejamento pastoral, vivemos o Ano da Esperança! Assim, nós o iniciamos com a festa do nosso padroeiro: São Sebastião, testemunha da Esperança.

 31.         A Nossa Senhora da Penha, Virgem da escuta e da contemplação, que intercede pelo povo do Rio de Janeiro do alto de seu penhasco, primeira discípula de seu amado Filho, confio este Ano da Vida Consagrada, olhando-a como modelo insuperável de seguimento no amor a Deus e no serviço ao próximo.

32.          Neste ano da Vida Consagrada, da Paz e da Esperança nós nos colocamos diante de Deus e transformamos nossas reflexões em oração, invocando a intercessão de Maria:

Senhora da Penha,

Senhora do penhasco, Senhora das alturas,

que, embora difíceis, tudo permitem vislumbrar

Senhora que intercede nas dores da vida,

escutai a prece dos(as) consagrados(as).

Acolhei a súplica que fazemos pelos(as) consagrados(as).

Senhora das Candeias, da Luz, da Paz e da Esperança,

Senhora que aponta o Cristo Jesus e nos manda fazer o que Ele disser,

ajudai-nos a descobrir, a cada dia, a beleza da consagração.

Fortalecei-nos no seguimento de Vosso Filho casto, pobre e obediente.

Senhora Aparecida, Senhora do Brasil,

Senhora da Vida, do sonho, da entrega e da firmeza.

Senhora que gerou Jesus no silêncio de Nazaré,

que O deu à luz na simplicidade de Belém,

que o recebeu nos braços aos pés da cruz.

Fazei que a consagração seja sempre vivida como missão,

na entrega, no serviço, na união, na disponibilidade, na partilha e na prece.

Amém.


São Sebastião do Rio de Janeiro, 2 de fevereiro de 2015

 Orani João Cardeal Tempesta, O.Cist.

Arcebispo de São Sebastião do Rio de Janeiro


[1] Cf. Papa Francisco, Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, n. 1

[2] Cf. Papa Francisco, Carta Apostólica Às Pessoas Consagradas, para proclamação do Ano da Vida Consagrada

[3] Papa São João Paulo II, Exortação Apostólica pós-sinodal Vita Consecrata, n.110.

[4] Cf. Constituição Dogmática Lumen Gentium sobre a Igreja, n. 12.

[5] Cf. 1Jo. 4, 8. 

[6] Cf. Decreto Conciliar Perfectae Caritatis, n. 2.

[7] Cf. Fl. 1, 21.

[8] Cf. Documento de Aparecida, n.27.

[9] Cf. 2 Cor. 4, 6.

[10] Papa São João Paulo II, Exortação Apostólica pós-sinodal Vita Consecrata, n.27.

[11] Cf. Jr. 1, 8.

[12] Cf. 2 Tm. 1, 12. 

[13] Cf. Lc. 1, 37.

[14] Cf. Rm. 5, 5

[15] Cf. 2 Cor. 12, 10.

[16] Cf Papa Francisco, Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, n.14.

[17] Cf. Mc. 16, 15.

[18] Cf. Discurso ao Papa Francisco à Cúria Romana, 2014

[19] Regra de São Bento

[20] Cf. 11º. Plano de Pastoral de Conjunto da Arquidiocese do Rio de Janeiro, n. 08.

Fonte: Redação